sábado, 30 de outubro de 2010

Textos Literários

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A tuberculose, a poética e literatura no Brasil

A tuberculose, a poética e literatura no Brasil

15/10/2010

A poética no Brasil por todo o tempo até o final da primeira metade deste século está quase toda impregnada pela tuberculose. Passa de 40 a relação dos vates vitimados pela tuberculose, entre os notórios e os menos conhecidos. A imensa maioria faleceu entre os 21 a 35 anos de idade. Eram jornalistas, advogados, rábulas, funcionários públicos, todos boêmios vivendo a noite nos bares, botequins, discutindo, bebendo e fazendo versos. Poetas pré-românticos, românticos, parnasianos e modernistas, conforme seu temperamento e evolução da doença, extravasaram seus sentimentos, uns sarcásticos, amargos, outros romantizando seus sofrimentos e outros ainda, fleugmáticos, ironizando sua sorte.

Seguem alguns trechos de poemas sobre a tuberculose, doença chamada de “mal do século”, e, ao final, o famoso Pneumotórax, de Manuel Bandeira, na íntegra.

Eu sei que vou morrer... dentro do meu peito
um mal terrível me devora a vida.
Triste Assaverus, que no fim da estrada
só tem por braços uma cruz erguida
Sou o cipreste qu'inda mesmo florido
Sombra da morte no ramal encerra!
Vivo - que vaga entre o chão dos mortos,
Morto - entre os vivos a vagar na Terra.
Castro Alves – Mocidade e Morte


A febre me queima a fronte
E dos túmulos a aragem
Roça-me a pálida face
Mas no delírio e na febre
Sempre teu rosto contemplo.
Eu sofro; o corpo padece
E minh'alma se estremece
Ouvindo o dobrar de um sino.
Casimiro de Abreu – No Leito


Falar somente uma linguagem rouca,
Um português cansado e incompreensível,
Vomitar o pulmão na noite horrível
Em que se deita sangue pela boca!
Expulsar aos bocados, a existência
Numa bacia automata de barro
Alucinado, vendo em cada escarro
O retrato da própria consciência...
Augusto dos Anjos – Os doentes

Noutros tempos a morte
Tinha asas e voava
Hoje ela me veio
Montando um cavalo
E eu irei na garupa
Numa viagem veloz
Putupum, putupum
Onde eu compro a passagem
No meu leito de doente
Para o país sossegado
País louro da morte
Onde um pulmão escavado
Serve de passaporte,
Putupum, putupum
É um país sossegado
Que não tem hemoptise;
É uma terra decente,
Sem escarros no chão,
Putupum, putupum. País sem suores frios,
Sem cadeiras de lona,
Sem bacilos de Koch
Putupum, putupum
E onde o vil pneumotórax
Por certo é ignorado
Putupum, putupum
Putupum.
Jamil Almansur Haddad – Tuberculose galopante


Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos,
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.
...............................................................................
Mandou chamar o médico:
- Diga trinta e três.
- Trinta e três... trinta e três... trinta e três...
- Respire.
...............................................................................
- O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
- Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
- Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.
Pneumotórax – Manuel Bandeira

Os trechos são citados no artigo de José Rosemberg Tuberculose - Aspectos históricos, realidades, seu romantismo e transculturação. Boletim de Pneumologia Sanitária, v.7 n.2 Rio de Janeiro.

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